quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Chirurgiae

(Edward Burtynsky em Westley, Califórnia.)


Hoje tive de voltar para o lugar onde vivi. E posso dizer que me senti ainda mais estranho.

O acaso (sempre ele) me fez voltar e, de certa forma, pareceu proposital. Encare!

Entenda bem. Não tenho lembranças ruins de lá. Posso bradar aos quatro ventos que conheço como poucos aquelas bandas. Sabia os caminhos, os atalhos, mesmo quando só a escuridão me fazia companhia. Era o meu escudo.

Regressei desarmado. Desamparado. Desconfiado.
Perguntei-me se queria resolver logo o que me levou ali - e o que me levou fazia parte do problema - fugindo sem dar pistas, como um autêntico estranho, ou passar mais tempo, visitando lugares e pessoas que pudessem me acolher e reaclimatar.

Nada feito. O lugar que me acolheu outrora parecia relutante em me aceitar de volta. Nas ruas em que eu quase flutuava, já não conseguia passar por pequenas distâncias sem algum solavanco. Nem minha erma companhia resolveu aparecer, ali, naquela hora. Quando eu mais precisei dela.
Sabia que tudo aquilo só existia na minha cabeça. Difícil foi tirar.

Resolvi encarnar o tipo mais clichê e covarde de forasteiro. Concluir tudo e fazer da minha fuga tão inóspita quanto foi minha (re) aparição. Não faria falta se não fizesse presença.

Contudo, ele estava lá. Onipresente. Onisciente.
deus? Não.

Por ACASO, minhas obrigações precisariam de mais um dia para serem sanadas. O que geraria uma re-volta. Mais do que literalmente. Mais uma vez o destino joga comigo.
Só que dessa vez eu aceitei o desafio.

No outro dia eu estava lá. Mesmos caminhos, mesma paisagem, A única sombra que me protegia era o daqueles óculos. Agora o medo do antes-próximo só fomentava minha adrenalina. Nem a espera, nem os desdobramentos que surgiram me tiraram desse ânimo tão inesperado que me fez acordar cedo, como qualquer pessoa normal.

E eu não sou assim.

(...)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Una Uma Unha

Eu só cortei metade da unha...

que diabos deu em mim? Era só mais um corte, meia unha, um clique e pronto.
Mas não.

Agora hei de conviver com essa obra inacabada, essa falha humana. O que haveria eu pensado na hora? Será que mudei de assunto comigo mesmo? Será que falaram comigo logo após o primeiro corte? Isso poderia ser perigoso! Um usuário distraído, um objeto cortante e pontiagudo em mãos inatas, um assunto fora de hora e pronto.
Tétano, na melhor das hipóteses.
Que viagem. Que morte estúpida.

Meu tendão de Aquiles na ponta do dedo. E nem se trata do dedo maior, aquele que por vezes mostro com maestria. Esse até tenho vergonha de mostrar. Uma continuação do membro superior direito que consegue ser inferior visualmente ao seu vizinho, o mindinho. Só serve para fechar a continha das duas mãos cheias, e sujas, se você estiver no jardim de infância.
Logo ele...aparecendo tanto assim, por um lapso mental, um branco periférico.

Sabe lá o que vão pensar de mim quando notarem tal anomalia. "Hii, ó lá o meia unha. Deve ter uma tesoura meia-boca".

Já sei. Vou andar de mão fechada até voltar pra casa, para o conforto do lar e dos cortadores disponíveis e úteis, se bem utilizados.

Prometo não roer.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

(...)
Berik Syzdykov fuma um cigarro, num vale da sua cidade cazaque de Semey. 24 de novembro de 2008. (Ed Ou/Reportage by Getty Images)

http://www.boston.com/bigpicture/2009/11/kazakhstans_radioactive_legacy.html


segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Angst

A maior angústia de um escritor é a página em branco.

Depois de um período de alguma inspiração (grande coisa...) fui instintivamente fugindo deste embate contra as pálidas superfícies, preferindo encarar as folhas já derrotadas. As lia como se estivesse fazendo pirraça, comemorando vitórias que, embora fossem das melhores, não eram minhas, e escondendo o meu vexame maior - a covardia literária. O meu a favor era torcer contra.

Dias, meses foram passando e minha existência verbal se resumia a papos informais. Meras doxas ou mesmo os entulhos acadêmicos de sempre. Meus textos passaram das duas mãos às duas cabeças, impulsivo como sempre e agora, cada vez mais, contingente. Os silêncios continuavam bem decorados, mas as páginas continuavam lá, plácidas, ao mesmo tempo me encarando e me tentando. E eu nem tentava.

Até que me rebaixei aos 140 caracteres...
o que parecia o fundo do poço para os ortodoxos (ou ainda o hype do momento para os descolados) acabou se tornando a minha fuga e o meu limbo. O conforto que senti ao poder continuar espalhando meus retalhos de ironia e semgracisse me faziam pensar se aquilo tudo não era apenas eu comendo o queijo da minha própria ratoeira.

Pois bem, aqui estou. Desafiando mais uma vez essa traiçoeira noção de vácuo semântico e sua aliada tecla que tudo apaga (e que 'por acaso' tem o END do lado); com o agravante de que o hímen-tal, sempre presente, está agora fortalecido pelo tempo em que apenas me diminuía somando me às vitórias de outros. Para, quem sabe, todo esforço ser recompensado com ainda mais trabalho.

A mim.