quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Cidides Perdadas

Uma sombra na praça, o vento que acalma o espírito e o banco que acolhe. As vezes penso como gêmeas tomando sorvete na rua, uma sempre mais serena que a outra, que invariavelmente foge da calçada, cuja vida contingente não poderia ser melhor.

O hoje busca novidade, o calor pior, o lugar mais longe, das pessoas menos suas, diferente do ontem de sempre, distante dos lugares comuns automatizados. Os diferentes percebem os ontem-hoje de outrem, que clamam tácitos para você apenas constar ali, pontualmente. Ao reclamar e descaracterizar este novo lugar - não seu - estará por clamar um ideal, o ontem próprio cotidiano.

O solo de guitarra interminável, na praça da igreja dos outros, lhe deixa ainda mais longe de tudo do que perto de casa. Pisando em ovos fritos no asfalto, o tempo-seu ali passa muito mais rápido do que o dos que ouvem o som de sempre, em redomas andantes de vidas-suas de ontem-hoje. Cidade que se encontra, que se discute, no tempo livre da semana, dos bichos presos e crianças soltas pela rua.

Cidades perdidas, que se encontram tão longe da perdição quanto das casas-ontem. 

Nos descaminhos das calçadas trôpegas, os sons se misturam e se anulam, emulando uma pressa desconectada dessa vivência nova (e breve). A busca pelo encontrar-se vive em si mesma, forasteira de uma Paradise City (não-sua) pelo caminho.   

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Desde-já-bafo

Ao escrever, entre vãos e vens, descobri que as palavras que realmente me descobrem são as que aparecem quando o assunto fácil falta. Falar de aventuras desventurosas ou ilusões amorosas é tão profundo quanto uma acne. E surgem na mesma faixa e(o)tária.

No começo o assunto parece brotar no meio da sua testa-teclado. Claro que você nunca dirá tratar-se de cornos (mesmo que sejam). O espelho será seu guia nos próximos passos digitais. Você então prepara suas mãos hábeis e começa a observar-se. Prazer e dor logo se misturarão naquele espetáculo sebáceo, pouco estimulável. Aquilo deixará marcas, mas esta luta contra o próprio corpo parece ser o seu baluarte de auto-estima-destrutiva.

Já revigorado pelo resultado, a publicização daquilo deve ser imediata. O pus vira troféu numa inversão bukowskiana de papéis orgânico-sociais. A vergonha daquela excreção vira prazer quando vista e reconhecida por outros como deles também. Não importa a cicatriz que deixa, aquilo já foi revigorante para você e para o possível voyeur-leitor.

(...)


terça-feira, 1 de junho de 2010

Alter-ego-ísmo

Antes de tudo, ou de mais nada, quero que saiba que eu escrevo primeiramente para mim.

Escrevo para reler e gostar. Não me preocupo em ser meu primeiro e último leitor. Quero desvincular o texto das aspirações ou expectativas de outrem. A escrita pela própria necessidade de palavras. Deixo claro que não preciso ter leitores fiéis a quem agradar. Nem farei por onde.

Deixo livre o texto, para fluir quando e para onde quiser. Estou farto de escritas obrigadas, viciadas e pretensiosas. Este espaço é de des-leitura cotidiana. Matérias 'pagas' serão devidamente identificadas.

Mas isso não facilita as coisas. Na posição de meu-maior-crítico não saio escrevendo sobre qualquer dor de cotovelo. De cabeça, sim. Textos cefaléicos que contagiarão quem percebe-lê-los nas suas singularidades em conjunto.

Não espere palavras bonitas. Não espere palavras feias. Não espere.

O meu ego não precisa ser alter inflado.

Não vou divulgar.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Clawnstrofilia

- Você acha que eu tenho cara de palhaço?!

(Loui) - E qual o problema? É moda hoje em dia. Todo mundo se pinta, se veste e, claro, se publiciza. Fazem tolices durante seus 15 minutos de ridicularidade e ganham pontos com seus pares. Que não sabem se levam mais a sério a si mesmos ou as suas imbecilidades. Meros coadjuvantes que entretiam o público enquanto mudava-se o picadeiro para os verdadeiros artistas. Foram dar importância a essa gente, agora aguenta. Não é um nariz vermelho e uma roupa idiota que vão tornar sua vida medíocre mais aceitável.

- Mas não dizem que os melhores palhaços são tristes?

- Que tropeçem e caiam de cara com a realidade. Quem sabe assim não consigo rir com suas des-graças.
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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Ascenda antes de Ler


(Loui) -Veja bem, o que eu queria mesmo fazer agora era acender um cigarro. Daqueles de apodrecer camisa, sabe? Essa noite...esse vento. Não ligo para a marca, ela não vai estampar meu pulmão. Queria o ardor gutural, a primeira tragada do primeiro cigarro do dia. Minha sobriedade combina com isso.

Ficaria ainda mais lúcido, ensimesmando-me. Sem a demência torpe do THC. Com nicotina e sem aquele ar de rebeldia estúpida adolescente. Sem clichês do cabeludo bêbado, fumante. Aquele que sua avó te manda ficar longe e o terror dos pais quando sogros. Sem transgressões de novela das 8.

Não quero fazer um tipo. Fazer pose e baforar tudo de podre que tenho nessa peristalse defumada. Fumaria para mim. Naquela praça a noite, com ninguém chegando. Perfeito. A sensação só minha. A chama cada vez mais perto, me chama. Puxe, segure, solte.

Chamo um dos meus melhores amigos da carteira. Um clique e o isqueiro acende. Sem drama.

- Mas você não faz mais isso...
- Por isso escrevo.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

1

(Loui) - Já não bebo mais.

O que diriam todos os meus ídolos se me vissem nessa situação, decadente e sem buscar nenhum refúgio, artificial ou natural, de meios de meio esquecimento da vida? Minha liberdade de escolha me fez não me aprisionar a tais substâncias, que serviam de veneno e remédio às minhas influências, demasiadamente humanas.

A vida como ferida não tratada, do pus vivaz do cotidiano...sem ao menos o delírio daquela coçeira, que sempre aparece e que te leva a passar a unha na recente e epidérmica camada de lucidez. Afinal, queremos ver a casquinha crescer ou nos satisfazemos no sangue visível novamente?

O pior é saber que se está no caminho mais difícil e perceber que a escolha é sua. E que mesmo havendo várias placas apontando o caminho mais fácil para lá, você sempre esteve indo por aqui. Enquanto você tentasse pender para o outro lado, menos você seria.

(...)

Acho que eu nunca seria ídolo de ninguém.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Chirurgiae

(Edward Burtynsky em Westley, Califórnia.)


Hoje tive de voltar para o lugar onde vivi. E posso dizer que me senti ainda mais estranho.

O acaso (sempre ele) me fez voltar e, de certa forma, pareceu proposital. Encare!

Entenda bem. Não tenho lembranças ruins de lá. Posso bradar aos quatro ventos que conheço como poucos aquelas bandas. Sabia os caminhos, os atalhos, mesmo quando só a escuridão me fazia companhia. Era o meu escudo.

Regressei desarmado. Desamparado. Desconfiado.
Perguntei-me se queria resolver logo o que me levou ali - e o que me levou fazia parte do problema - fugindo sem dar pistas, como um autêntico estranho, ou passar mais tempo, visitando lugares e pessoas que pudessem me acolher e reaclimatar.

Nada feito. O lugar que me acolheu outrora parecia relutante em me aceitar de volta. Nas ruas em que eu quase flutuava, já não conseguia passar por pequenas distâncias sem algum solavanco. Nem minha erma companhia resolveu aparecer, ali, naquela hora. Quando eu mais precisei dela.
Sabia que tudo aquilo só existia na minha cabeça. Difícil foi tirar.

Resolvi encarnar o tipo mais clichê e covarde de forasteiro. Concluir tudo e fazer da minha fuga tão inóspita quanto foi minha (re) aparição. Não faria falta se não fizesse presença.

Contudo, ele estava lá. Onipresente. Onisciente.
deus? Não.

Por ACASO, minhas obrigações precisariam de mais um dia para serem sanadas. O que geraria uma re-volta. Mais do que literalmente. Mais uma vez o destino joga comigo.
Só que dessa vez eu aceitei o desafio.

No outro dia eu estava lá. Mesmos caminhos, mesma paisagem, A única sombra que me protegia era o daqueles óculos. Agora o medo do antes-próximo só fomentava minha adrenalina. Nem a espera, nem os desdobramentos que surgiram me tiraram desse ânimo tão inesperado que me fez acordar cedo, como qualquer pessoa normal.

E eu não sou assim.

(...)

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Una Uma Unha

Eu só cortei metade da unha...

que diabos deu em mim? Era só mais um corte, meia unha, um clique e pronto.
Mas não.

Agora hei de conviver com essa obra inacabada, essa falha humana. O que haveria eu pensado na hora? Será que mudei de assunto comigo mesmo? Será que falaram comigo logo após o primeiro corte? Isso poderia ser perigoso! Um usuário distraído, um objeto cortante e pontiagudo em mãos inatas, um assunto fora de hora e pronto.
Tétano, na melhor das hipóteses.
Que viagem. Que morte estúpida.

Meu tendão de Aquiles na ponta do dedo. E nem se trata do dedo maior, aquele que por vezes mostro com maestria. Esse até tenho vergonha de mostrar. Uma continuação do membro superior direito que consegue ser inferior visualmente ao seu vizinho, o mindinho. Só serve para fechar a continha das duas mãos cheias, e sujas, se você estiver no jardim de infância.
Logo ele...aparecendo tanto assim, por um lapso mental, um branco periférico.

Sabe lá o que vão pensar de mim quando notarem tal anomalia. "Hii, ó lá o meia unha. Deve ter uma tesoura meia-boca".

Já sei. Vou andar de mão fechada até voltar pra casa, para o conforto do lar e dos cortadores disponíveis e úteis, se bem utilizados.

Prometo não roer.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

(...)
Berik Syzdykov fuma um cigarro, num vale da sua cidade cazaque de Semey. 24 de novembro de 2008. (Ed Ou/Reportage by Getty Images)

http://www.boston.com/bigpicture/2009/11/kazakhstans_radioactive_legacy.html


segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Angst

A maior angústia de um escritor é a página em branco.

Depois de um período de alguma inspiração (grande coisa...) fui instintivamente fugindo deste embate contra as pálidas superfícies, preferindo encarar as folhas já derrotadas. As lia como se estivesse fazendo pirraça, comemorando vitórias que, embora fossem das melhores, não eram minhas, e escondendo o meu vexame maior - a covardia literária. O meu a favor era torcer contra.

Dias, meses foram passando e minha existência verbal se resumia a papos informais. Meras doxas ou mesmo os entulhos acadêmicos de sempre. Meus textos passaram das duas mãos às duas cabeças, impulsivo como sempre e agora, cada vez mais, contingente. Os silêncios continuavam bem decorados, mas as páginas continuavam lá, plácidas, ao mesmo tempo me encarando e me tentando. E eu nem tentava.

Até que me rebaixei aos 140 caracteres...
o que parecia o fundo do poço para os ortodoxos (ou ainda o hype do momento para os descolados) acabou se tornando a minha fuga e o meu limbo. O conforto que senti ao poder continuar espalhando meus retalhos de ironia e semgracisse me faziam pensar se aquilo tudo não era apenas eu comendo o queijo da minha própria ratoeira.

Pois bem, aqui estou. Desafiando mais uma vez essa traiçoeira noção de vácuo semântico e sua aliada tecla que tudo apaga (e que 'por acaso' tem o END do lado); com o agravante de que o hímen-tal, sempre presente, está agora fortalecido pelo tempo em que apenas me diminuía somando me às vitórias de outros. Para, quem sabe, todo esforço ser recompensado com ainda mais trabalho.

A mim.